O Diagnóstico: o pensamento sem pensador

 

A letra do diagnóstico psy, em psiquiatria, psicologia e psicanálise tem representado um grande Real na diacronia da busca do ser do ente ou se quisermos, na desconstrução do Dasein.

Dasein de que falo é o de Heidegger. O meu discurso sobre diagnóstico psíquico faz semblant com o inconsciente ou o sujeito, termos equacionais.

O significante estrutura(psicótica, neurótica, perversa) diminui a nossa ansiedade, quando pensamos o termo diagnóstico como tragédia ou drama do outro. Grande impacto causa-nos a pintura que representa o Dr. Pinel, psiquiatra francês, a retirar as correntes dos loucos no então hospício La Pitié Salpetrière, em Paris. O ato pineliano, à luz da hermenêutica histórica, apresenta o arcaico germe da antipsiquiatria, seguido pelo trabalho inicial da construção da psicanálise por Freud e pelas escrituras de Karl Jaspers.

Antes de continuar nessas cogitações, revivo uma fala de Martin Heidegger: “O pensamento não traz conhecimento como as ciências. O pensamento não produz sabedoria prática utilizável. O pensamento não resolve os enigmas do Universo. O pensamento não nos dota diretamente com o poder de agir.”

A questão do diagnóstico psy, que associamos ao pensamento sem pensador, dito de Dr. W. Bion. O mundo tal qual existimos nele, está hiperpopulado por pensamentos sem pensador, em busca de um pensador. Na esfera epistêmica, o discurso do diagnóstico designa uma fala imposta no campo do Um e da certeza narcisista da ciência. Os diagnosticadores são uma função de Estado, entidade política, que trabalham sem co-cogitação com o sujeito. Portanto, há a unilateralidade tirânica, neantizante rumo à facticidade, classificação dos estados psíquicos e indubitável marca de exclusão.

O diagnóstico, no tocante à tetralogia discursiva de Lacan(o discurso do universitário, o discurso do mestre, o discurso da histérica e o discurso do analista) firma-se nas estruturas ditatoriais do discurso do mestre, nega a liberdade de pensar, na prática de um positivismo mortífero.

Embora no discurso do mestre atenuado pela própria histeria, o filósofo Michel Foucault militou, produzindo escrituras seminais que pensavam os pensamentos sem pensador, guia da visão do socius, na dicotomia racionalista cartesiana res cogitans e res extensa. A res cogitans entrou para o mundo infernal da racionalidade. Daí, as escrituras libertadoras foucaultianas, tais como, Histoire de la Clinique, Histoire de la follie, Histoire de la sexualité, Vigiar e punir, etc.

Militância significante, a de Foucault! A utopia da democracia na subjetividade do sujeito. Fim dos hospícios e asilos prisionais. Fim do pavor das famílias que tivessem em seu seio alguma estrutura psíquica pouco con-sistente e o abandono do ser. Neutralizar pelo pensar o sintoma psíquico/mental, até então um Real borromeico na dicotomia corpo-mente, como na Judéia pré-Jesus.

Para avançarmos o pensar do pensamento sem pensador, a propósito do diagnóstico psy, reflitamos. O pensamento sem pensador foge do metaphorein. É mumificação do significado no Real. A impossibilidade metafórica mumifica-o na estagnação do significado, retira-o do efeito de sentido. O pensamento sem pensador não é usado pela chose pensente do sujeito e sim pelo senso comum-buraco.

Para jogar luz neste campo epistemológico, invoquemos Kant que discursa sobre duas estruturas a Vernunft (a Razão) e a Verstand (o Intelecto). A Razão trabalha com os pensamentos, cogitação dos objetos, em processo ascendente na busca do sentido, cujo limite é o incognoscível. O Intelecto lida com o conhecimento, sólido, não questionado, não re-pensado, não re-pensado. A supremacia do conhecimento como o positivo e do pensamento como negativo estancam o movimento da epistemologia.

O diagnóstico, como fala imposta, não é semblant. O sujeito diagnosticado cai na impossibilidade do discurso, hermenêutica eproairesisDas Ding an sich (a coisa-em-si) não sai donoumenom ao phainomenon. Ai está à louca ensimesmidade do diagnóstico psy, negação do semblant.

diasophia, na psicanálise, ocupa a conexão fenomênica/transferencial psicanalista-analisante. A diasophia é umafolisophie lacaniana, um saber singular partejado na maiêutica psicanalítica do 2, 3, 4, etc(lugares, objetos analíticos). Das Unbewusstsein(o inconsciente freudiano) indica que psicanalisar implica na busca tentativa do saber que não se sabe, a totalidade do percurso analítico.

diasophia ou a dia-gnosis na geometria analítica é a reta com sua atribuição infinita, percorrida pelo par analítico e seus parceiros do inconsciente.

Para a família do diagnosticado, a marca da esquizofrenia, pensamento sem pensador, exclui como um implacável fatum, foraclui a suplência do sujeito. A desalienação residual ao outro conduz aotragos grego.

Em mais uma cogitação, a decadência do sintoma do homem no pensar nietzschiano. A loucura divina do deus Dionísios, cai o sintoma, cai a Grécia clássica. O racionalismo socrático-platônico conduz ao pior. No pior socrático-platônico nasce o diagnóstico-fatum.

A estrutura do sujeito produz o campo de trabalho dos psicanalistas, com base no inconsciente fenomênico e numênico. O significante representa o sujeito para outro significante. Ah! Ainda temos o semblant, lançado no seminário de Lacan D’un discours qui ne serait pas du semblant.

O ideal do discurso é o discurso sem fala, diz Lacan. O diagnóstico produzido em minutos é produto do discurso sem fala, discurso exarcebado no Imaginário do aparelho psíquico do RSI-sinthome.

 

Dr. Campos Menezes, Psicanalista